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Mulheres na liderança no agronegócio

Netas, filhas, mães, sobrinhas e esposas, as mulheres têm presença cada vez mais ativa e protagonista no campo. Apesar disso, ainda são minoria em um setor dominado por homens. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apenas 31% das propriedades rurais no país eram comandadas por mulheres em 2022. Se, por um lado, as inovações no campo tornam o trabalho braçal cada vez mais dispensável, por outro, o perfil de liderança das mulheres e o apoio de entidades representativas, como o Sebrae Minas, aceleram a sucessão feminina nas fazendas.

Formada em Sistemas da Informação, com MBA em Gestão de Pessoas, a cafeicultora Mariselma Sabbag encontrou no campo a chance de transformar a sua vida e a de outras tantas mulheres. Na fazenda herdada do pai, em Conceição da Aparecida, no Sul de Minas, a CEO da Café Renovo produz grãos verdes e torrados, drip coffees e cápsulas. Fora da propriedade, ela trabalha para fortalecer a cafeicultura feminina, ao adquirir parte da produção de empreendedoras locais.

Mãe de três filhos, Mariselma também é líder do Comitê de Agronegócio do Grupo Mulheres do Brasil, presidido por Luiza Trajano, e presidente do capítulo brasileiro da Aliança Internacional das Mulheres do Café (IWCA, em inglês). Presente em 35 países, a IWCA nasceu do encontro de mulheres da indústria do café dos Estados Unidos com produtoras da Nicarágua. Atualmente, atua na promoção da sustentabilidade nas lavouras e na formação de mulheres.

No Brasil, a organização se divide em dez subcapítulos, cujas líderes conectam produtoras locais a outras mulheres na busca por soluções para o setor. “A jornalista, cafeicultora e ativista Josiane Cotrim me apresentou o trabalho da IWCA Global em 2010, quando despertei para a falta de reconhecimento das mulheres na cafeicultura nacional. Ao ganharem voz nos últimos anos, elas não só apareceram como se organizaram em dezenas de associações pelo país”, ressalta a gerente de Agronegócios do Sebrae Minas, Priscilla Lins.

Produtora há 24 anos, Mariselma defende maior diversidade de gênero no campo. Não por acaso, presta consultorias sobre equidade de gênero e participa há 12 anos da IWCA Brasil, acompanhando a ascensão de outras colegas. “Quando fortalecemos uma mulher, também a incentivamos a sentir-se dona daquele local e protagonista de sua história. Hoje, as associadas da IWCA estão cada vez mais preparadas para gerir desde o plantio até a comercialização”, destaca.

Dulcineia Prado é produtora em Luisburgo, na Zona da Mata. Crédito: Pedro Vilela

O investimento em capacitação técnica e de gestão ajudou as associadas a acessar o mercado internacional, adicionando mais valor ao produto e prolongando a sustentabilidade econômica das fazendas. Isso foi impulsionado pelo Sebrae Minas, com capacitações e programas para a formação de lideranças. “Se hoje somos empoderadas, com certeza foi porque o Sebrae esteve ao lado da IWCA ao longo desses anos”, diz Mariselma.

Desde 2013, o Sebrae apoia a participação da IWCA Brasil na Semana Internacional do Café (SIC), ampliando o contato das associadas com outras profissionais do mercado de café, como traders classificadoras, degustadoras e baristas. “A entidade também aproximou a IWCA do programa Sebrae Delas e promoveu um workshop com líderes da organização para discutir as estratégias e a visão de futuro da IWCA no país. Com os resultados desse trabalho, realizado em 2022, conhecemos melhor as necessidades que as associadas têm”, acrescenta Priscilla.

Parceria pela equidade

A 667 km de Conceição da Aparecida, Dulcineia Prado mantém uma tradição que rende frutos há três gerações. À frente do Sítio Fortaleza, em Luisburgo, na região das Matas de Minas, ela produz cafés especiais na companhia do marido, e engenheiro agrônomo Daniel Prado e de suas duas filhas. Hoje, aos 47 anos, ela é proprietária da Dulce Maria Cafés Especiais, marca certificada pelo selo internacional Rainforest Alliance, em 2021. Na ocasião, a iniciativa – que valoriza a sustentabilidade nas fazendas – garantiu à família R$ 20 a mais por saca de café.

Vice-presidente da IWCA Brasil, Dulcineia assumiu a administração do Sítio Fortaleza há 27 anos, depois de perder o pai, sair para estudar fora e retornar para substituir os irmãos no controle do negócio. “Na época, a sucessão feminina na cafeicultura ainda era um tabu. Então, assim como outras mulheres, saí para estudar. Mas a vontade de continuar o legado do meu pai era maior. Digo que não escolhi a cafeicultura, foi ela que me escolheu.”

A liderança da produtora de Luisburgo se estende à vice-presidência da Associação de Mulheres do Café da Região das Matas de Minas e Caparaó (AMUC). “Fiquei muito feliz ao perceber que não estava sozinha na cafeicultura, mas cercada por outras mulheres com histórias inspiradoras. Sempre fizemos o operacional no pós-colheita, fundamental nas fazendas. Agora, mostramos que somos capazes de fazer a gestão total da propriedade”, orgulha-se.

Dulcineia considera que a associação entre a presença da IWCA Brasil e a expertise do Sebrae Minas tem contribuído para profissionalizar as lavouras sob gestão feminina. “Essa parceria fortalece a cadeia de valor do café ao destacar a indicação geográfica do nosso produto, melhorar a gestão, aumentar a rentabilidade e nos mostrar que as propriedades também são empresas”, salienta.

Filhas do Agro

A combinação entre transição profissional e sucessão familiar dá tempero à história de Marília Censoni. A fisioterapeuta abandonou uma carreira de dez anos para arrendar parte da fazenda dos pais. “Deborah Cordeiro e Joice Appelt, fundadoras da Associação Filhas do Agro (AFA), convidaram sucessoras rurais para compartilhar o que aprenderam na Academia de Liderança de Mulheres do Agronegócio (Alma). Minha jornada no agro começou após esse convite”.

Formalizada em 2020, com o apoio do programa Sebrae Delas e da Associação dos Produtores Rurais e Irrigantes do Noroeste de Minas Gerais (Irriganor), a AFA surgiu para germinar a força feminina no agronegócio por meio de formações técnicas. “A rede criou um ambiente seguro para que as filhas de produtores trocassem experiências com outras que já haviam vivenciado o processo de sucessão, muitas vezes fazendo uma transição de carreira para assumir um legado familiar”, enfatiza a analista do Sebrae Minas Patrícia Rezende.

Grupo reúne 60 mulheres que vivem o dia a dia no agronegócio. Crédito: Arquivo pessoal

Com o apoio do Sebrae, Deborah e Joice conseguiram oferecer uma trilha de aprendizado para 30 mulheres da região, iniciada em outubro de 2020. “Atravessamos a pandemia de Covid-19 estudando para nos tornarmos líderes no agronegócio. O Sebrae nos preparou sob os aspectos de gestão, liderança, finanças, inovação e cooperação – e ainda nos prepara com cursos, eventos e consultorias. Atualmente, somos 60 mulheres espalhadas por Paracatu, Unaí, João Pinheiro, Vazante e Guarda-Mor, uma das maiores áreas irrigadas por pivôs centrais no país”, ressalta Marília. Mãe de dois filhos, ela administra uma fazenda produtora de soja – com safrinhas de milho, sorgo e feijão – em Paracatu, no Noroeste de Minas. “Apesar de morarmos na região há 40 anos, só ia à fazenda para passear nos fins de semana. Não tinha noção do quanto custava um pivô para irrigação. Quando comecei, foi tudo novo. Meu pai me deu liberdade para participar do negócio, mas essa não é a realidade de todas as mulheres. Por isso, o Sebrae nos preparou também para falar sobre sucessão junto às nossas famílias”, explica.

Inédita, a trilha de aprendizado oferecida pelo Sebrae às Filhas do Agro foi adaptada à realidade da região, contemplando as especificidades do agronegócio e os diferentes níveis de maturidade daquelas mulheres. “Precisávamos desenvolver uma solução customizada para o projeto, a partir da compreensão entre a gênese do agronegócio e as soluções do Sebrae. Uma trilha nova, que não fosse avançada o suficiente para excluir ninguém nem elementar demais para as mulheres com experiência na gestão das fazendas”, esclarece Patrícia.

Sementes do futuro

Mais maduras e preparadas, as Filhas do Agro seguem formando sucessoras na região. A produtora Renata Martini, de João Pinheiro, representa a terceira geração de uma família com raízes no campo. “Eu me formei em Odontologia e me especializei em Endodontia. Montei meu consultório e atendi até pouco antes de minha filha Liz nascer. Foi quando a pandemia explodiu. Não sabia o que me esperava quando fui surpreendida pelo convite do grupo Filhas do Agro.”

A AFA motivou Renata a seguir os passos do avô e do pai, iniciando uma transição de carreira pouco provável. “A oportunidade de fazer parte dos negócios da família surgiu. Então, deixei a carreira na área da saúde e me aprimorei no agro. Ao lado do meu pai, meu maior professor, assumi a gestão financeira da VPM Agropecuária e a gestão ambiental da Mesapec. Mas foi a confiança das Filhas do Agro que me moveu ao novo. É lindo ver tantas produtoras rurais se apoiando e dividindo suas dores, conquistas e desafios”, diz.

Administradora de um negócio de produção de grãos, como soja, feijão, milho e sorgo, e de pecuária de cria, recria e engorda, encorajar a sucessão familiar feminina no agronegócio. “Devemos quebrar as barreiras que existem dentro de nós e nos apoiarmos em quem acredita no nosso potencial. Afinal, o olhar da mulher é criterioso, e sua voz é mais do que necessária para o sucesso no campo.”

Admiradora do trabalho do Sebrae Minas, a gestora da VPM Agropecuária enaltece o papel da entidade na modelagem da estrutura, organização e práticas da AFA, fortalecendo conexões entre as produtoras da região e o empreendedorismo feminino. “O Sebrae nos ajudou a definir papéis de governança dentro das nossas empresas, bases sólidas para a sucessão. Graças a esse trabalho, posso plantar na Liz a semente da continuidade dos negócios da família”, finaliza.

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